OBRIGACAO TRIBUTÁRIA ACESSORIA OU DEVER INSTRUMENTAL?
A
normatização do plexo jurídico positivado é revelado por PAULO DE
BARROS CARVALHO com o seguinte conteúdo: “A experiência jurídica, como
toda a experiência, implica pressupostos, e a premissa básica, que está
na raiz do pensamento ora posto, é o construtivismo radical representado
pelo “giro lingüístico”, mediante o qual os discursos, sejam
científicos ou metafísicos, não revelam uma realidade subjacente, mas a
constituem e o fazem pela linguagem”.
A
relação entre Pessoas sujeitas à tributação e o Estado, como poder
público, é uma relação jurídica, com normas especificas e genéricas, que
desencadeiam uma obrigação tributária para as partes envolvidas nesta
realidade.
Em
toda relação jurídica positivada em normas legais, existe um fato ou
ato anteriormente previsto pelo legislador, o qual sua consecução,
omissão ou tolerância faz nascer uma relação jurídica tributária, da
qual decorre uma obrigação tributária. A lei descreve um fato, mediante
linguagem própria, e atribui a este o efeito de criar uma relação entre
Alguém e o Estado.
Nos
ensinamentos de HUGO DE BRITO MACHADO podemos definir obrigação
tributária como: “Obrigação tributária é a ralação jurídica em virtude
da qual o particular, sujeito passivo, tem o dever de prestar dinheiro
ao Estado, sujeito ativo, ou de fazer, não fazer ou ainda tolerar algo
no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos, e o Estado
tem o direito de constituir contra o particular um crédito.”
Ao
tratar da obrigação tributária, interessa-nos a acepção da obrigação
como relação jurídica, designando o vínculo que adstringe o devedor a
uma prestação, em regra pecuniária, em proveito do credor, que, por sua
vez, tem o direito de exigir essa prestação contra o devedor que está
adstrito a prestá-la.
A
obrigação é uma categoria dogmática colocada em cada disciplina do
estudo jurídico, enquanto que o dever é categoria formal no estudo da
Teoria Geral do Direito. Segundo SOUTO MAIOR BORGES a relação entre
obrigação e dever jurídico constitui relação entre forma e conteúdo onde
o estudo do dever jurídico abrange a forma da obrigação pertinente pela
classificação do seu conteúdo.
Devemos
discorrer a respeito da obrigação no seu sentido civilista puro, como
sendo o vínculo entre dois sujeitos de direito juridicamente
qualificados no sentido de um deles titularizar o direito de receber do
outro uma prestação de dar, fazer, não fazer ou mesmo tolerar.
Nos
ensinamentos do civilista FABIO ULHOA CANTO, a obrigação é o vínculo
entre sujeitos de direito, em que um deles deve cumprir uma prestação de
interesse do outro, que, por sua vez, tem o direito de a receber e
cobrar, tal prestação não é caracterizadora da obrigação civil mas
configura o conteúdo da mesma.
Quando
os cientistas do Direito Civil afirmam que o conteúdo patrimonial é que
determina a obrigação e sua prestação, está-se identificando a
obrigação civil apenas pelo conteúdo e não pelo contexto dos deveres
jurídicos.
A
obrigação tributária não é diversa da obrigação civilista como
instituto do direito obrigacional, se particulariza no campo dos
tributos pelo seu objeto que será sempre uma prestação de natureza
tributaria, seja de dar, fazer, não fazer ou até mesmo tolerar.
A
obrigação civil nasce da vontade das partes é sempre uma manifestação
dos sujeitos, mesmo nascendo como efeito da subsunção do fato à uma
regra jurídica, posto que mesmo a obrigação civil é adjetivada ex lege, e portanto sempre pela norma jurídica posta deve ser regrada.
O
nascimento da obrigação tributaria independe de manifestação de vontade
do sujeito passivo dirigida a sua criação, nos textos de LUCIANO AMARO
“não se requer que o sujeito passivo queira obrigar-se; o vinculo
obrigacional tributário abstrai a vontade e até o conhecimento do
obrigado; ainda que o devedor tributário ignore ter nascido a obrigação,
seja ela principal ou acessória, esta o vincula e o submete ao
cumprimento da prestação que corresponda ao seu objeto, por isso a obrigação tributaria se diz ex lege .”
ALFREDO AUGUSTO BECKER censura a qualificação de certas obrigações como obrigações ex lege, dizendo que todo e qualquer dever jurídico é, sempre e necessariamente, ex lege, porque
nasce como efeito de incidência de uma regra jurídica, e portanto a
obrigação nasce da própria linguagem que a define e constitui.
Concluí-se
pois, que a obrigação tributária e a obrigação civil têm liames
parecidíssimos até mesmo idênticos apesar de ambas apresentarem regimes
normativos diversos que em alguns momentos se cruzam, relacionam ou nem
mesmo se conhecem.
A
obrigação é categoria jurídico-positiva, é construção do direito
normatizado, sendo assim é ao direito positivo que incumbe a definição
dos requisitos, do conteúdo necessários à identificação de um dever
jurídico qualquer como sendo um dever obrigacional.
A
positivação do direito é o exercício de conteúdo normativo que
determina o dever como obrigacional, através da determinação do conteúdo
do dever se determina a obrigação não sendo carente o conteúdo
patrimonial para que determinado dever seja obrigacional.
CLÓVIS
BEVILÁQUA, civilista, para quem obrigação é uma “relação transitória de
direito que nos constrange a dar, fazer ou não-fazer alguma coisa, em regra economicamente apreciável,
em proveito de alguém que, por ato nosso ou de alguém conosco
juridicamente relacionado, ou em virtude da lei, adquiriu o direito de
exigir de nós esta ação ou omissão”.
Este
conteúdo econômico patrimonial constante da definição de obrigação de
tão renomado autor, não tem necessidade de ser interpretado como
absoluto já que ele mesmo suscitou que apenas em regra o conteúdo das
obrigações é econômico e existem portanto exceções. Este brilhante
civilista não coloca as obrigações, na acepção genérica do verbete, como
exclusivamente de apreciação econômica, mas as coloca como dever
obrigacional jurídico onde poderá haver exceções de conteúdo sem que
deixem de constituir obrigações nas modalidades criadas pelos
legisladores.
WASHINGTON
DE BARROS MONTEIRO, que encerrou sua definição de obrigações
ressaltando o caráter de garantia patrimonial, como a seguir se observa:
“O obrigação é a relação jurídica, de caráter transitório, estabelecida
entre devedor e credor, e cujo objeto consiste numa prestação pessoal
econômica, positiva ou negativa, devida pelo primeiro ao segundo,
garantindo-lhe o adimplemento através do seu patrimônio”, não ressaltou
as exceções contidas na prestação pessoal econômica, nem tampouco o fato
de as obrigações, como dever jurídico, nascerem como efeito da
incidência da norma jurídica posta, o entendimento da obrigação
tributaria, como obrigação do regime jurídico tributário, não deve
necessariamente conter conteúdo patrimonial para que obrigação o seja,
apesar de obrigação tributária com conteúdo patrimonial ser a mais
importante no aspecto financeiro, são as obrigações ditas pela
legislação e pelo CTN como obrigações tributarias constituem-se pelo seu
conteúdo normatizado.
Entende-se
que o elemento distintivo entre ambas as obrigações é o objeto da
obrigação tributária, é a prestação de cunho tributário sobre a qual há o
vínculo jurídico entre o sujeito ativo, a Fazenda Pública, e o sujeito
passivo, o contribuinte. Tal prestação em face de seu objeto divide a
obrigação tributária em principal, dar o tributo representado pelo
conteúdo econômico e acessória representando um fazer, não - fazer ou
tolerar algo de natureza instrumental tributária.
Neste mesmo sentido a lição do Professor LUCIANO AMARO que brilhantemente ministra verbo ad verbum : "É pelo objeto que a obrigação revela sua natureza tributária" .
Para
PAULO DE BARROS CARVALHO as obrigações acessórias têm designação
imprecisa, nome impróprio, uma vez que para ele, a nomenclatura
obrigações acessórias não apresentam o elemento caracterizador dos laços
obrigacionais inexistindo nelas prestação passível de transformação em
termos pecuniários, nos seus ensinamentos são liames concebidos para
produzirem o aparecimento de deveres jurídicos, que os súditos do Estado
hão de observar, no sentido de imprimir efeitos práticos à percepção de
tributos, configuram-se pelo dever de prestar informações, não prestar
ou tolerar, executando certos atos e tomando determinadas providencias
de interesse geral, para que a disciplina do relacionamento comunitário e
a administração da ordem pública ganhem dimensões reais e concretas.
A
ausência da prestação patrimonial, conteúdo econômico, no caso das
obrigações tributarias acessórias, não desfigura o caráter obrigacional
da relação jurídica ex lege, apenas torna a obrigação na sua
acepção mais ampla sem descaracterizá-la como dever obrigacional
ontologicamente classificado por sua prestação não pecuniária.
A
prestação da obrigação tributária não é irremediavelmente econômica,
pode se resolver de forma econômica em decorrência de sua inobservância,
mas é um dar, fazer ou não fazer de caráter geralmente econômico mas
não necessariamente assim, o que não desvirtua o adjetivo de obrigação
da relação jurídica tributaria sem caráter econômico, as classificadas
obrigações acessórias.
A
obrigação tributaria é definida em todos os seus contornos pelo direito
positivo, a obrigação acessória foi normatizada como prestações de
fazer não fazer ou tolerar em beneficio da fiscalização tributaria
portanto constitui obrigação mesmo não contendo dever patrimonial as
prestações ditas pelo CTN como acessórias.
A
doutrina de SOUTO MAIOR BORGES nos ensina que a não realização da
conduta obrigatória é então o pressuposto para a aplicação de uma sanção
jurídica. É esse precisamente o conceito do dever jurídico. Para
obte-lo recorre-se a uma teoria relativamente formal do dever jurídico.
Esse passa a ser encarado como uma categoria de Teoria Geral de Direito
e, pois, formal. Prescinde da consideração sobre eventuais conteúdos
jurídico-dogmáticos, contemplados, pelo direito positivo, na
configuração das obrigações em geral. Para que o dever jurídico se identifique como obrigação, a análise teórica deve ser focada no direito posto, no CTN portanto.
O
critério de obrigação, as relações jurídicas decorrentes da lei, ex
lege, de regime jurídico tributário, mas sem caráter pecuniário, as
obrigações de fazer, não fazer ou tolerar em prol do fisco não se
desfiguram de obrigações, continuam dessa forma, é obrigação tributaria
tipificada pelo Art. 113 do CTN e sua inobservância ganha conteúdo
pecuniário através da imposição legal normativa da pena pecuniária
representada no CTN pelos Autos de Infração e Imposição de Multa.
Portanto,
existe a certeza de que as obrigações tributárias não se desvirtuam da
linguagem posta, constituem sim a construção lingüística obrigações, e
possuem conteúdo ontológico e significado semântico jurídico
permanecendo tal como foram criadas.
Quanto
a acessoriedade da obrigação tributária de fazer, não fazer ou tolerar o
caminho leva ao mesmo sentido de PAULO DE BARROS CARVALHO em que a
nomenclatura acessória da obrigação a vincula à uma obrigação principal,
mas nem sempre as duas existem em determinado fato jurídico tributário,
existirão casos, e inúmeros deles, em que apenas é observável a
obrigação acessória sem existir uma principal, e num caso assim seria
acessória de que se não existe principal, nesse sentido o Dr Paulo, tem
extrema propriedade e portanto são instrumentais tais obrigações,
justamente por configurarem formalidades legais impostas pela lei
tributária sem a preocupação de que deva existir a obrigação principal.
Surge
a OBRIGACAO TRIBUTÁRIA INSTRUMENTAL, após todo esse discurso,
apresenta-se a normatização mais interessante do que o CTN nomina de
obrigações acessórias.
Obrigação
sim, pois o conteúdo econômico das obrigações de alguns dos grandes
civilistas se mostra ultrapassado, e nega que a obrigação deva
necessariamente conter prestação pecuniária, para poder concordar com
outros que trouxeram a este pequeno trabalho sua definição de obrigação,
e sendo assim continuam as obrigações, ditas, acessórias como
obrigações tributarias.
Mas
a acessoriedade das obrigações do CTN causa certa ausência de
significação às prestações de fazer, não fazer ou tolerar, que as
compõe, traz dependência de existência à uma obrigação principal.
Não
resta dúvida que tais obrigações não são apenas acessórias, até mesmo
são, mas sem duvida também podem ser independentes, não necessitam da
principal para serem denominadas acessórias, podendo a legislação
tributaria apenas determiná-las como instrumentais, da mesma forma que o
brilhante Dr Paulo as nominou e pelos mesmos motivos dele.
Após
todo este discurso e presentes todas as argumentações pertinentes as
obrigações acessórias estariam mais bem normatizadas pelo CTN se fossem
designadas OBRIGACOES INSTRUMENTAIS.
PENSAMENTOS LINGUISTICOS DO DIREITO TRIBUTARIO
GENNARO ANGELO MARTUCCI